A primeira instituição oficial
alusiva à educação especial implantada no Brasil, de acordo com Januzzi (2004),
foi o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, inaugurado no ano de 1854, ainda
durante o período imperial brasileiro, pelo imperador D. Pedro II, auxiliado
pelo ministro do Império Couto Ferraz, sendo que em 1981 passou o citado
instituto a se denominar Instituto Benjamin Constant – IBC.
Avançando em nossa análise,
durante os séculos XVI e XVII evidenciam-se na sociedade brasileira diversas
situações de exclusão social das PD’s, aquela promovendo práticas sociais de
discriminação para com essas. Foram séculos em que a ignorância e rejeição à PD
eram praxe das suas próprias famílias, das escolas, enfim, de toda a sociedade
brasileira, que relegavam a PD a uma situação de extremo preconceito e exclusão
social.
Dessa forma, as PD’s em geral
eram tratadas como verdadeiros doentes anormais, sendo internados em
manicômios, orfanatos, prisões e lugares afins, sendo que “[...] na antiguidade
as pessoas com deficiência mental, física e sensorial eram apresentadas como
aleijadas, mal constituídas, débeis, anormais ou deformadas” (Fernandes, 2005,
p.25).
Com o passar do tempo, nos
séculos XVIII e começo do XIX, vive-se na sociedade brasileira a fase da
“institucionalização especializada”, onde as PD’s continuavam a ser segregadas
do convívio social, mas eram confinadas em suas próprias residências, sendo oferecida
a elas uma espécie de educação extraescolar, com a desculpa de “proteger” a PD
da maldade da sociedade, excluindo-a do contato com as demais pessoas. Consoante
Batista (2006), ao mesmo tempo em que surgia a necessidade de escolarização
entre a população, a sociedade passa a conceber o deficiente como um indivíduo
que, devido suas limitações, não podia conviver nos mesmos espaços sociais que
os “normais” – deveria, portanto, estudar em locais separados e só seriam
aceitos na sociedade aqueles que conseguissem agir o mais próximo da
normalidade possível, sendo capazes de exercer as mesmas funções. Marca este
momento o desenvolvimento da psicologia voltada para a educação, o surgimento
das instituições privadas e das classes especiais.
Começam a surgir a partir do
início do século XX, ainda que de forma incipiente, diversos movimentos
sociais, políticos e educacionais, estudiosos, associações e conferências
aprofundam as discussões, problematizando os aspectos acerca da inclusão
socioeducacional das PD’s, resultando em reflexões diante das práticas
educacionais. Assim, conforme expõe Jannuzzi (2004, p. 34):
A partir de 1930, a sociedade civil começa a organizar-se em associações
de pessoas preocupadas com o problema da deficiência: a esfera governamental
prossegue a desencadear algumas ações visando à peculiaridade desse alunado,
criando escolas junto a hospitais e ao ensino regular, outras entidades
filantrópicas especializadas continuam sendo fundadas, há surgimento de formas
diferenciadas de atendimento em clínicas, institutos psicopedagógicos e outros
de reabilitação.
Nesse ínterim, surgem alguns
movimentos sociais de luta contra a discriminação com relação às PD’s, visando
a uma sociedade mais inclusiva e justa socialmente, gerando críticas sobre as
práticas segregadoras da época, rendendo questionamentos aos tradicionais
modelos de ensino ainda em prática e que resultavam em exclusão
socioeducacional das PD’s em geral. De acordo com Aranha (1996, p. 15), as
principais contribuições se deram pelos seguintes movimentos:
·
Centros Populares de Cultura (CPC), que surgem em 1961, espalhando-se
por todo o Brasil entre 1962 e 1964;
·
Os Movimentos de Cultura Popular (MCP) aparecem no ano de 1960, contando
com o educador e filósofo Paulo Freire, ícone da educação como direito social
no Brasil e no mundo;
·
O Movimento de Educação de Base (MEB), criados em 1961 pela Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB.
Em 1964 o golpe militar
desarticula esses movimentos, considerando-os subversivos e punindo seus
respectivos lideres. Os MEB foram os únicos que continuaram, mas tiveram que
mudar a direção de suas atividades e diminuir suas ações.
Entretanto, ainda na década de
60, é promulgada a primeira LDB brasileira, a lei 4.024/61, denominada Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, trazendo em seu bojo textual que os
“excepcionais” tinham o direito à educação, preferencialmente integrados no sistema
geral de ensino público. De acordo com o Título X (LDBN/1961):
A educação dos excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no
sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade (...) toda
iniciativa privada considerada eficiente
pelos conselhos estaduais de educação, e relativa à educação de excepcionais,
receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudos,
empréstimos e subvenções.
Devido a essas previsões legais
da LDB/61, se de um lado constava a integração de todos os alunos com
deficiência no sistema educacional público, de outro a citada Lei impunha o
incentivo às iniciativas privadas que visassem à inclusão dos alunos com
deficiências. Tal fato denota um viés contraditório da LDB/61, distanciando o
que estava constante na Lei e o que se observara na realidade social da época,
período em que não se efetivaram as políticas públicas de acesso universal à
educação, continuando no campo educacional as políticas especiais que tratavam
de forma segregatória os alunos com deficiência.
Na década seguinte, temos
a promulgação da nossa carta magna, a Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988, onde se aborda o direito à educação da seguinte forma: Em seu Título
VIII (Da Ordem Social), Capítulo III (Da Educação, da Cultura e do Desporto),
Seção I (Da Educação), nos Artigos 205, que aborda o direito de todos os
cidadãos à “Educação, direito de todos
e dever do Estado e da Família, será promovida e incentivada com a colaboração
da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o
exercício e sua qualificação para o trabalho” (grifo nosso); e 208, inciso III,
onde encontramos que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a
garantia de “atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino”.
Definidas as
deficiências, consoante a Lei 7.853, temos
importante texto que visa à inclusão social das pessoas com necessidades
educacionais especiais estabelecendo normas
gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais mesmas,
visando sua efetiva integração social. Em seu
Artigo 2º, estabelece-se que os órgãos e entidades da administração direta e
indireta devem dispensar, no âmbito de sua competência e finalidade, aos
assuntos objetos desta Lei, tratamento prioritário e adequado, tendente a
viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas na área da educação:
a) a inclusão, no sistema educacional, da
Educação Especial como modalidade educativa que abranja a educação precoce, a
pré-escolar, as de 1º e 2º graus, a supletiva, a habilitação e reabilitação
profissionais, com currículos, etapas e exigências de diplomação próprios;
b) a inserção, no referido sistema
educacional, das escolas especiais, privadas e públicas;
c) a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação
Especial em estabelecimento público de ensino;
d) o oferecimento obrigatório de programas
de Educação Especial a nível pré-escolar, em unidades hospitalares e congêneres
nas quais estejam internados, por prazo igual ou superior a 1 (um) ano, educandos
portadores de deficiência;
e) o acesso de alunos portadores de
deficiência aos benefícios conferidos aos demais educandos, inclusive material
escolar, merenda escolar e bolsas de estudo;
f) a matrícula compulsória em cursos
regulares de estabelecimentos públicos e particulares de pessoas portadoras de
deficiência capazes de se integrarem no sistema regular de ensino.
Em relação a Libras
(Língua Brasileira de Sinais), promulgou-se a lei 10436/02, que é a lei que a regulariza
e reconhece como um sistema linguístico, com a sua própria estrutura
gramatical, sendo a mesma de natureza visual-motora, originada da comunidade de
pessoas surdas do Brasil. A mesma ainda destaca as responsabilidades do poder
público, da saúde e do sistema educacional, cada um com o seu papel. O
primeiro, de divulgar e expandir a Libras, o segundo em atender e promover
tratamento adequado ao deficiente auditivo e o terceiro, em agenciar o processo
de inclusão fornecendo nos cursos de ensino médio e superior a modalidade Libras
a profissionais da educação, constituindo a Libras como disciplina obrigatória
em todos os cursos de Licenciatura e Fonoaudiologia. A Lei ainda obriga entidades
públicas e privadas a oferecer acessibilidade em Libras, inclusive na internet.
Outras leis nacionais
também abrangem a inclusão das PD’s, como o Estatuto da Criança e do
Adolescente/ECA (Lei nº 8069/90) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional/LDBEN (Lei nº 9394/96), embora de forma mais difusa e genérica.
Em relação aos
instrumentos legais inerentes à construção de uma sociedade inclusiva no âmbito
internacional e das quais o Brasil é signatário, cujos decretos já foram
promulgados, podem ser arrolados como documentos orientadores da implantação e
implementação de políticas públicas adequadas ao processo de inclusão social
das PD’s a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), Declaração de
Jomtien (1990), Declaração de Salamanca (1994), Convenção da Guatemala (1999), Convenção
Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – ONU (2006), ratificada no
Brasil pelo decreto nº 6949/2009, dentre outras. Essas, têm como princípios:
a) O respeito pela
dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as
próprias escolhas, e a independência das pessoas;
b) A não-discriminação;
c) A plena e efetiva
participação e inclusão na sociedade;
d) O respeito pela
diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência como parte da
diversidade humana e da humanidade;
e) A igualdade de
oportunidades;
f) A acessibilidade
(inclusive através das TAI’s e internet).
Todas essas
legislações e fatos históricos estão relacionados com o atual cenário no
tocante à inclusão socioeducacional das PD’s, conforme nos relata Cury (2002,
p. 259):
A declaração e a garantia de um direito tornam-se imprescindíveis
no caso de países, como o Brasil, com tradição elitista e que tradicionalmente
reservam apenas às camadas privilegiadas o acesso a este bem social. Por isso,
declarar e assegurar é mais do que uma proclamação solene. Declarar é retirar
do esquecimento e proclamar aos que não sabem, ou esqueceram, que eles
continuam a ser portadores de um direito importante. Disso resulta a necessária
cobrança deste direito quando ele não é preservado.
Com o exposto, evidencia-se que a
inclusão socioeducacional dos surdos advém de um processo histórico que ainda
encontra-se em evolução, apesar das conquistas e avanços jurídicos, sociais e
tecnológicos, urgindo a necessidade de analisarmos a inclusão dessas Pessoas
Surdas no seio da sociedade, através da educação e mediante a utilização das
Tecnologias Assistivas Informatizadas.